quarta-feira, 26 de novembro de 2008

A palavra “coreografia”: sua história e sua origem



[...] O termo “coreografia” tem um contexto histórico variado, ele é derivado da palavra coreia (χορεία), uma dança grega dançada em círculos e acompanhada por canto. Derivados da palavra coreia são usados para descrever danças de círculo em alguns lugares: Khorovod (Rússia), Hora (Romênia, Moldova, Israel), Horo (Bulgária). Paracelsus usou o termo “coréia” para descrever os movimentos físicos rápidos, dos viajantes medievais.

Raoul Feuillet e Pierre Beauchamp usaram uma adaptação da palavra coreia para descrever a notação da dança. Chorégraphie de Feuillet (1700) ajustou o termo para um método da notação da dança e estabeleceu-se o termo chorégraphie (coreografia) para a escrita, ou notação das danças. Assim, uma pessoa que escrevesse para danças era um choreographer (coreógrafo), mas o criador das danças era conhecido como um “mestre da dança“ (Le maître un danser) ou, em uns anos antes, um “mestre do ballet”.

Desta forma, o termo “coreografia” surge na dança em 1700, na corte de Luiz XIV, para nomear um sistema de signos gráficos, notação da dança, capaz de transpor para o papel o repertório de movimentos do balé daquela época. Seu criador, Raoul Auger Feuillet, mestre de balé, introduziu seu neologismo que literalmente quer dizer a grafia do coro. Vem do grego choreia (dança), e graphein, (escrita), significando a arte de criar e compor uma dança.

A rejeição do vocabulário e dos termos do ballet pela dança moderna resultou no termo “coeógrafo” que substitui o “mestre do ballet” e conseqüentemente a “coreografia” veio significar a arte de fazer danças.

A partir do século XIX, a técnica de “escrever o movimento” recebeu um nome: “notação coreográfica”. O termo coreografia passou a significar a arte na composição da dança, e o coreógrafo, o profissional que coordena essa composição.

Não se sabe ao certo como aconteceu a mudança no emprego do termo coreografia como sistema de notação para estrutura de organização dos movimentos do corpo no tempo e no espaço, a hipótese provável é de que, como em outros casos, a marca coreografia tenha assumido tamanha popularidade que substituiu o produto dança. Sabe-se, no entanto, que foi Serge Lifar quem publicou o Manifesto Coreográfico 1935, onde coreografia aparecia em sua nova acepção. Este manifesto seguiu a lógica de outros manifestos da época em diferentes áreas da arte, não trazia uma sistemática de abordagem prática, e sim, apresentava linhas gerais nas quais a arte da dança deveria se pautar [...]

(trecho do texto "A Escrita da Dança: pequeno histórico da notação sobre a notação do movimento" de Ana Lígia Trindade, publicado no Idanca)

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Sexta-Feira Especial

Carol Gualberto, no II Fórum de Cristianismo Criativo

Não poderia deixar de registrar aqui a minha experiência no último fim de semana. Na última sexta-feira (dia 21/11), rolou o 3º encontro do II Fórum de Cristianismo Criativo, promovido pela W4 Editora e pelo Portal Cristianismo Criativo. O evento aconteceu na Livraria Cultura, em SP, e contou com a participação de 80 pessoas.

A noite teve início com uma palavra da Whaner Endo que apresentou o fórum e fez aquela introdução básica. Em seguida, um vídeo produzido pelo "Plataforma" (se vc ainda não conhece, acesse www.plataforma.art.br) e a minha apresentação de um trecho do trabalho que o catavento tá construindo. Logo depois, um pocket-show de Jorge Camargo e daí as entrevistas comigo e com o Jorge, feitas pelo Sérgio Pavarini. Um momento especíalíssimo!!! Quem foi ou acompanhou on-line pela net sabe disso.

Depois, uma saídinha básica com muita gente bacana e que tem trabalhado muito pra que a arte "cristã" deixe o estágio da mediocridade e volte a ser relevante e bela como nos tempos de Handel, da Vinci e Bach. "Cada um na sua, mas com alguma coisa em comum."

Me marcaram as boas conversas, as pessoas tão interessantes, a produção de cada um, o sentimento comum de que o catavento tem muitos parceiros nessa caminhada!

Um beijo especial para Whaner e Ana Endo (W4 Editora e Portal CC), Davi Julião e Carol Gama (Plataforma), Sérgio Pavarini (PavaBlog), Gedeon Alencar ("Protestantismo Tupiniquim", Ed. Arte Editorial), Luiz Pequeno (Virá) e Jorge Camargo.
Carol Gualberto

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Muito mais que um fórum


Escrevo sob o impacto do que vivi na Primeira Igreja Batista em Bultrins (Olinda/PE), durante o VII Fórum Popular de Reflexão Teológica, cujo tema foi "Igreja, Evangelho e Cultura".

Tenho muito pra contar sobre a igreja, seu foco, suas pessoas, sua comunidade. Mas vou deixar pra um outro momento. Por enquanto, quero destacar o seu grupo de arte, como prova viva de uma belíssima aliança e troca entre cultura e evangelho. Evangelho genuíno na dança, nas cores, nos pés, nas rodas, na cultura de Pernambuco vivenciada e revelada em cada detalhe, em cada movimento.

Fica em mim (e certamente no catavento) a esperança crescente de uma igreja verdadeiramente viva e atuante, que se relaciona com a comunidade, que se abre para o povo, que se multiplica e se constrói a partir e na cultura.

O que vi foi genuína "dança cristã" ou "dança de adoração" (que evidencia Deus) ou "dança profética" (que traz sinais do Reino) ou "dança litúrgica" (liturgia enquanto celebração no nosso dia-a-dia) ou sejá lá que nome novo já inventaram para a dança produzida por cristãos...

E dizem que eu é quem fui convidada pra palestrar, pra dar oficina...

Valeu a pena! Valeu muito a pena!

Carol Gualberto


terça-feira, 11 de novembro de 2008

Qual é a sua dança?

por Carol Gualberto
Passeando pela internet, sempre desejando entender como os cristãos têm se relacionado com a dança, esbarrei em uma pesquisa on-line que perguntava: Qual é a sua dança preferida? Para responder, bastava escolher uma das opções: dança moderna, balé moderno, balé clássico, dança litúrgica, dança de rua, dança hebraica e dança espontânea.

Passeando pela cidade e observando os letreiros, li a placa de uma grande academia que, dentre tantas modalidades corporais como Jazz, Musculação, Balé Clássico e Jiu-Jitsu, oferecia ainda o curso de Dança de Adoração.

Passeando por aqui e com uma profunda inquietação, optei por “dar a cara a tapa” e dizer que, em meio a tantas opções esquisitas, ainda não me encontrei. Qual é a minha dança? Quem pergunta certamente não sabe muito bem a enorme diferença entre dança moderna e balé moderno, quanto mais os fundamentos (se é que eles existem) das danças litúrgica e espontânea. Ainda assim, percebo-me um “peixe fora d’água”, sem lagoinha pra nadar.

O que define a dança? Sua técnica, seu intuito, seu contexto? Será que essas danças com nomes gospel têm como objetivo santificar a dança que a igreja acredita ser tão mundana e impura?O que significa ter aulas de Danças de Adoração ou Dança Profética? Se a Bíblia já define o que é adoração (Colossenses 3:17 – “E tudo o que fizerdes, seja em palavra, seja em ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, dando por ele graças a Deus Pai.") porque preciso fazer aulas pra aprender a adorar com a dança? Ela, que por si só, pode adorar a Deus a partir do momento em que eu faço uma coreografia bem feita, ainda que a mesma não tenha uma temática óbvia cristã. Posso adorar a Deus com danças fazendo uma boa aula, ainda que o curso seja de dança-afro ou qualquer outra dança “menos sacra”. Se busco crescer, estudar, pesquisar e me aperfeiçoar corporal e tecnicamente, estou adorando a Deus, ainda que focada mais no corpo (ou seria carne?) que na “alma”.

E com toda essa confusão e bagunça espiritual, descobri que adorar a Deus é, essencialmente, tratar o assunto com seriedade e propriedade, não sendo levado por qualquer nova onda que surge, legitimando bizarrices e loucuras ─ a-danças inventadas em nome de Deus.

Qual é a sua dança? Dentre as opções sugeridas pelos modismos evangélicos, ainda não encontrei a minha resposta. Espero que você também não.
(texto escrito para o Portal Cristianismo Criativo)

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Não dá pra perder



Se você é de SP ou não é de lá e tem a oportunidade, não deixe de comparecer à 28 Bienal Internacional de Arte de SP. Tipo de programa bom e interessante pra qualquer idade, qualquer idéia, qualquer pessoa.


Desde 26 de outubro até 06 de dezembro. De terça a domingo, das 10h às 22h.


sábado, 1 de novembro de 2008

Que dança a gente dança


"Essa tal de dança contemporânea"

– Tu faz dança? Que legal! Mas que tipo de dança?– Dança contemporânea.
O sujeito fica parado e depois de vencer o constrangimento:
– Mas o que é essa tal de dança contemporânea?
Daí o vivente, que faz dança contemporânea e sabe bem o que faz, se vê em apuros para dar uma resposta clara. Afinal, dança contemporânea não é uma técnica ou método que vem com rótulo. Então, ele arrisca:
– Sabe o Quasar Cia. de Dança? – que o vivente acha referência no país e crê ser bastante conhecida.
O sujeito permanece na mesma.
– E o Grupo Corpo? – ele lembra, já entrando em desespero. – E Deborah Colker? – ainda que não fosse o melhor exemplo que você quisesse dar.– Ah, já vi na televisão, responde o sujeito finalmente com um brilho no olhar de quem agora pode encerrar a conversa.
E o vivente, com a certeza de que não conseguiu explicar e que melhor que explicar era sugerir que assistisse a um espetáculo.


A realidade é esta que o suposto diálogo acima ilustra. A idéia de dança contemporânea não consolidou uma referência para a maioria do público (e mesmo para a comunidade de dança), ainda mais num Estado que vê com desconfiança aquilo que não é tradição. E isso vale muitas vezes para quem produz, ou acha que produz, dança contemporânea. Basta ver a confusão em tantos festivais competitivos. O território da dança contemporânea é um vale-tudo. Passos de jazz com música experimental. Neoclássico ao som do diálogo dos bailarinos. Dança de rua com um toque de vanguarda. E a obra, nesta lógica estapafúrdia, é avaliada por especialistas de toda ordem, menos de dança contemporânea.
Esta realidade tem como origem a rara circulação de informações e o consumo de informações descontextualizadas e superficialmente elaboradas. A qualidade dessas informações é essencial e precisa ser difundida a quem pretende preparar um treinamento, criar, julgar e apreciar a dança contemporânea. Não dá para saborear morangos e reclamar de que não têm gosto de figos. Ninguém curte uma partida de futebol sem conhecer as regras do jogo. Nesse sentido, é preciso apresentar alguns fatos, ainda que de forma sintética, para que eles possam falar desta tal de dança contemporânea.
Fato 1. A dança contemporânea não é uma escola, tipo de aula ou dança específica, mas sim um jeito de pensar a dança. Forjada por múltiplos artistas no mundo, teve nas propostas da Judson Church, em Nova York, na década de 60, sua mais clara formulação de princípios. Dentre eles, o de que cada projeto coreográfico terá de forjar seu suporte técnico. E que ter um projeto é percorrer escolhas coerentes, como o fez Trisha Brown – e também, longe dali, na Alemanha, Pina Bausch, com sua dança-teatro, nos anos 70. Tal princípio implicou tanto a preservação de aulas de balé nutridas por outras técnicas e linguagens quanto o abandono do balé e a incorporação, por exemplo, de técnicas orientais. Assim, passou a se constituir uma infinidade de alternativas, como o teatro-físico do DV-8 (companhia inglesa composta só por homens, que aborda a homofobia e que recorreu ao uso de corpos que expressam força, agressividade e sexualidade, coisa que o balé não podia fornecer).
Fato 2. Não há modelo/padrão de corpo ou movimento. Portanto, a dança não precisa assombrar por peripécias virtuosas e nem partir da premissa de que há “corpos eleitos”. Na dança contemporânea, a máxima repetida por pedagogos ortodoxos de que “não é tu que escolhes a dança, mas a dança que te escolhe” não tem sustentação. E, dessa forma, pode-se reconhecer a diversidade e estabelecer o diálogo com múltiplos estilos, linguagens e técnicas de treinamento.
Fato 3. Dança é dança. A dança contemporânea reafirma a especificidade da arte da dança. Dança não é teatro, nem cinema, literatura ou música. Apesar de poder ganhar muito com a cooperação dessas artes. A dança não precisa de mensagem, de história e mesmo de trilha sonora. O corpo em movimento estabelece sua própria dramaturgia, sua musicalidade, suas histórias, num outro tipo de vocabulário e sintaxe.
Fato 4. The Mind is a Muscle, proclamou Yvone Rainer quando a dança pós-moderna norte-americana abalava o estabilishment. Pensamento e corpo, tão separados na tradição ocidental, não são entendidos como lugares estranhos um ao outro. Até mesmo a ciência já traz evidências de que razão e emoção não são opostos. O pensamento se faz no corpo e o corpo que dança se faz pensamento. Isso não implica uma cerebralização fria, no caminho de uma dança conceitual, nem na biologização vazia da dança. Tal princípio não exime a qualidade técnica, nem o sabor e o prazer de dançar. Ele ressalta a complexidade que precisa ser compreendida.
Tais fatos precisam começar a ecoar, se o objetivo é saber o que é esta tal de dança contemporânea, que as pessoas insistem em dizer que fazem e que insiste em permanecer em cartaz em teatros, calçadas, estúdios [...] A partir desses fatos, pode-se muito (mas não se pode qualquer coisa). A liberdade trazida pela perspectiva da dança contemporânea não dispensa idéias fortes e a inventividade das grandes obras de qualquer forma artística, nem um domínio técnico (ainda que isso não caiba mais apenas nas esfera do aprendizado de passos corretos). A dança contemporânea evidencia que escolhas estéticas revelam posturas éticas. Numa época de tantas barbáries impostas ao corpo, é preciso recuperar esta ética quando se escolhe fazer arte com o corpo – seja o seu, seja (principalmente) o dos outros.
A dança contemporânea parece ter aceitado a provocação, com ecos de contemporaneidade, de Jean George Noverre. O mestre de dança, em 1760, ao falar sobre o balé e as rígidas regras da dança da época, afirmava: “Será preciso transgredi-las e delas se afastar constantemente, opondo-se sempre que deixarem de seguir exatamente os movimentos da alma, que não se limitam necessariamente a um número determinado de gestos”. Num mundo de tantas conquistas e descobertas sobre nós, seres humanos, seria no mínimo redutor ficar tratando a dança como apenas uma repetição mecânica de passos bem executados. Fazer tais passos, na música, ursos, cavalos e poodles também fazem. Creio que o ser humano pode ir mais longe que isso. Talvez este seja o incômodo proposto por esta tal de dança contemporânea. O de que podemos ser mais e muitos.

(texto de Airton Tomazzoni, extraído de Idança)